terça-feira, 13 de abril de 2010

A cerveja e o ladrão

— Mmm... hehehe, pelo visto não sou só eu que vou tomar cerveja pra ver o jogo hoje...
— É, hahahaa... tem que ser, né? Não tem coisa melhor.

É, ter, tinha. Acho que minhas duas long necks mostravam um gosto mais refinado que as seis latinhas da Ludmila em cima do caixa do supermercado.

Muito comum esse nome onde moro. Impressionante.

Enfim, aqueles quadris judiados sumiram de minha vista logo a seguir. Judiados mesmo, coisa de mulher tratada a trago, noites mal dormidas, cerveja, comida e anticoncepcionais desencontrados. Mas tinha charme, a putaça. Parecia um carro antigo, uma Kombi, com quilômetros rodados, terrenos difíceis vencidos, reformas mal feitas, branca e cheia de utilidade ainda. Tivesse eu oportunidade, pegaria a Ludmila. Mesmo que eu soubesse que não era tarefa tão complicada assim.

Minha vez de pagar minhas cervejas. Enquanto eu estava ali, adentrou um sujeito acompanhado de sua decadente esposa, um pobre diabo na certa devedor das calças a alguma loja que lhe enterrou juros e tudo o mais. Foi provavelmente comprar mantimentos e antepasto para sua enorme família de ranhentinhos. Entrou no mercado com uma camiseta dessas associações futebolísticas semi-amadoras de alguma favela. Perdão, de alguma comunidade, enfim.

Algo se movimentava suspeitamente debaixo de sua camiseta e eu pensei que era algum guaipeca sarnento que ele devia chamar de “meu cusco”. Não pensei em armas ou algo assim, pois estava com os quadris da Ludmila ainda povoando minha cabeça imunda. Mas logo saquei que era o maldito braço do cara, certamente quebrado e tapado de gesso. Botou o braço pra dentro da camiseta a fim de proteger aquela bosta da fina chuva que assaltava Taquara.

Caso encerrado pra mim. Mas uma tia, com seu carrinho cheio de comida de rico, ficou encucadíssima com aquele organismo enorme se mexendo debaixo da camiseta do cidadão. Deve ter pensado tratar-se de alguma arma de fogo ou algum disfarce ridículo para algo que ele poderia roubar de dentro do mercado. Fiquei pensando na falta que faz um quadril na mente das pessoas nessa hora.

Imaginei, também, que ela iria direto nos ouvidos dos meganhas do mercado acusar a presença de um malfeitor no convívio de pessoas decentes. Os seguranças, temerosos pelos clientes, todos cretinos, claro, iriam abordar o pobre bicho:

— Ô, rapá, aquela dona lá disse que tu tá ferrado aí, malandro!
— Capaz, capaz! Tô com a porra do meu braço fodido pra caralho... aqui, ó!
— Perdão e desculpe-nos.

O trabalhador-braçal se dirigiria até a velha e diria algo do tipo:

— Minha senhora, quando não tiver nada para fazer, favor comprar comida pra minha família, que passa uma fome do inferno!
— Mas, mas...
— E casa um crivo pro maridão aqui, também...

Seria um desaforo à falida sociedade taquarense. Nada de pedidos falsos de desculpas. Uma cesta básica todo mês para alimentar uma tigrada seria melhor.



Paguei as cervejas capitalistas e opressoras e esperei uma goleada. Mas não contra o meu time, como foi o que aconteceu. Os quadris esbagaçados de Ludmila fariam melhor ao meu ego.

Um comentário:

  1. "Fiquei pensando na falta que faz um quadril na mente das pessoas nessa hora." Totalmente verdade!

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