terça-feira, 21 de dezembro de 2010

Calorias, gorduras, lípidos e um pouco de milho.

Tenho um problema muito sério com esse negócio de comer fora de casa (no sentido de 'deglutição', 'nutrir as células'). Dificilmente algum estabelecimento desse Brasilzão véio de Deus me agrada por completo. E isso que eu vou frequentemente em locais ditos imaculados da capital gaúcha. É como aquele disco que a crítica classifica como sensacional, daí tu ouve e saca que é, no fundo, só ondinha de bacana metido a descolado, que não tem coragem de ser iconoclasta. E de bundão idólatra Porto Alegre tá entupida.
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Levei a mocinha para passear pela cidade e mostrar os pontos escondidos da paisagem açoriana. A zona Sul da cidade é um local inexplorado culturalmente. Tipo, parece que o ambiente urbano se resume a Cidade Baixa, Centro e Bomfim (isso se escreve separado?). E, tá, são bairros bonitos e fundamentais, mas há mais para ser conhecido. Fiz questão de mostrá-la um pouco da praia de Ipanema, que ao contrário do que pensam, não fica no Rio.
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- Ai, Marat... isso aqui me lembra minha terra... passarinhos cantando e tudo...
- Tô ligado. A parada aqui é chapa quente!
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Depois, descemos mais ao Sul para curtir o visual praiano que domina as terras à beira do Guaíba. Parece outro lugar... tu vê, dá para o malandro morar lá na Ponta Grossa e ainda afirmar que mora em Porto! Dissiparidades sociais evidentes, estrada e mato. Principalmente mato e areia. Mercadinhos de canto de bairro, fábricas e vilarejos que contrastam com um enorme conjunto habitacional burguês, com campo de golfe para os ricos praticarem suas tacanhas habilidades no esporte mais tedioso e sem graça depois do hipismo.
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Após enriquecedor reconhecimento de área, voltamos para a base, no Centro, e esperamos o verso de Gessinger, "anoiteceu em Porto Alegre", tomar corpo. Tive a brilhante ideia de jumento de comer fora, num momento em que seria mais prático, barato e higiênico mandar brasa numa Miojo de Galinha Caipira. Mas nããão... lá foi Marat, querendo impressionar sua garota, levando-a para jantar em algum local já devidamente eternizado pelos cidadebaixenses.
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Um cachorro-quente? Claro... não há como um raio cair 3 vezes sobre o mesmo cidadão. Nem todos os cachorros são ruins. Vem à mente o Faiscão, trailer que permeou minha infância com cheiros de hambúrgueres e salsichas com molho misturadas ao odor agridoce do mato que quase cobria a esquina da Sílvio Delmar Hollembach com a Baltazar de Oliveira Garcia. Foi desativado e com ele se foram memórias, milhos, ervilhas e ripas de madeiras podres usadas como assento.
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Optamos por uma carrocinha situada na Rua da Província, que eu sempre mirava mas nunca tocava. Os caras eram rápidos e trataram a gente como gado. Sinal de boa comida. Quando peguei o meu, já absorto na fome, saquei o erro: esperança. Não, rotedogue bom era só no Leopoldina mesmo... maldição dos infernos, mais uma barca de queijo ralado pra comer??? Mas que infeliz ideia essa de copiar cachorro paulista, tchê? Foda-se se eles gostam de purê em excesso a ponto de esbagaçar o pão! Nós, agora, temos que compensar com queijo salgado, batata palha e maionese? Puta maçaroca
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Aconteceu o óbvio. Deixei, sem querer, 30% da refeição pelas calçadas ensebadas da rua, mesmo tendo todo o cuidado para não passar vergonha frente à mocinha. Ela, por seu lado, me deu uma aula de como aproveitar toda a comida e presenteou o santo com pouquíssimo caldo. Pensei seriamente em fazer lançamento de comida contra os atendentes, de maneira a puni-los vilmente por sua brincadeirinha de mal gosto.
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Saímos dali com barriga cheia (eu, trinta porcento a menos, como já disse), mas beiçudos de raiva pela porcaria que aprontamos sob risadas de metaleiros gordos. Pensando bem, merecem a salmonella que se instalou sem sombra de dúvidas naquelas panças da morte. Fui me curar com uma Zillertal na casa da negavéia. Saudade fodida do tempo dos cachorros prensados.

quarta-feira, 15 de dezembro de 2010

Segredos do Marat 1

Aniversário de 30 não tem o charme do de 25. Um quarto de século é mais interessante. Só sei que a principal questão era: com que roupa eu vou?
Pirei escolhendo a camiseta 'comemorativa' do evento balzaquiano. Alguma de Rock? Não, não haveria corpo que chegasse para comportar todas. Resolvi usar uma do Inter mesmo.
Porque assim: desde pequeno, sei que sou duas coisas, basicamente: homem e Colorado. Como não tenho uma camiseta escrito 'homem', usei uma do Saci mesmo.

domingo, 12 de dezembro de 2010

Minoria

Sempre fui um sujeito a me orgulhar de minha condição na sociedade. Escrevia quase em letras garrafais: "sou um homem heterossexual, civil, capitalista, tropical, ocidental, caucasiano, roqueiro".
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Eis que parece que pisar firme nessa proposição se tornou quase crime no meu Brasilzão véio de Deus. Conseguiram, com a Nova Bundamolice (sim, havia uma Velha Bundamolice, chamada Censura e Moral & Os Bons Costumes), criar leis que impedem de minorias serem achincalhadas.
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É o preconceito. Sei (sabemos) que quando isso passa dos limites, a sociedade só atravanca. Não é benéfico pra ninguém. Mas minha visão de preconceito é um pouco mais estreita e passa bem longe de achar que um cara que xinga outra pessoa deva assinar TCs ou ser preso. Isso também atravanca, pois temos que cuidar tudo o que falamos.
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Preconceito pra mim é impedir via documental e física que alguém tenha as mesmas oportunidades que gente dita da 'maioria'. Negros, homossexuais, estrangeiros, deficientes físicos e mentais. Pra mim, todos são iguais e tem condições de seguir adiante e contribuir para a máquina. Sendo assim, não parece absurdo criar leis que garantam que isso DEVA acontecer? Não se pode mais nem pensar algo de ruim pelos outros. Vivemos num mundo de conto de fadas, onde tudo é belo e cultivamos boas vibrações para os outros. É tanta cota disso ou daquilo que começo a achar que é errado ser homem, hetero, enfim...
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Eu é que sou de uma minoria agora. Preciso de leis que me protejam em específico. Estudei pra caramba (assim como poderia qualquer um), tenho bom gosto pras coisas, pago impostos caros, paro na faixa e não poluo a droga do meio ambiente. Tenho um plus: não uso gírias da moda, como "desenvolvimento sustentável" e ainda assim sou engrenagem fundamental da roda.

Tá, o vespeiro tá cheio e mexer nele pode trazer problemas. Vou lá passar um fator 15 nos braços, pegar meu carro, minha garota e meu disco do AC/DC e vou encher a cara de cerveja uruguaia por aí.

quarta-feira, 8 de dezembro de 2010

Conversinha

- Ai, Marat! Simplesmente não te suporto, idiota! Não te enxerga, cara? Fica aí se irritando com as músicas que eu ouço com meus amigos?! E daí que tu não gosta delas? Escuta as músicas de diabo que tu gosta e deixa de ser preconceituoso! Opção sexual é de cada um, cada um cuida de sua vida! Não dá mais pra te ouvir sempre largando piadinha a cada vez que eu canto. Se eu canto alto, é porque eu sou feliz! Espero que esteja bem claro!
- Tá, tá... saquei. Mas bem que tu podia falar isso com voz de homem, né?...

quarta-feira, 1 de dezembro de 2010

Na alegria e na tristeza

Durante minhas férias na casa de minha prima no bairro Tristeza, em Porto Alegre, pude presenciar um troço que vai ficar plantado nas malditas lembranças de 2007.
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Era fevereiro e eu precisava desopilar um pouco, mesmo sendo conhecido como o maior empurrador-com-a-barriga da região metropolitana. Estresse? Só conheci uma vez e foi de me cagar nas calças. A casa da primona era de classe média alta, o que garantiu pleno conforto desse observador torto do cotidiano. A não ser pela insistente presença de ácaros no quarto onde eu ficava, tudo rolou na paz. Pude aproveitar as manhãs para zanzar a esmo pelo bairro e curtir como era calculada a vida de burguês: casas imensas, mal desenhadas (mil peças, mas tudo do tamanho de caixinhas de fósforo), cercas elétricas, cães famintos, esnobismo, cafonice e um carro oneroso enfiado na garagem.
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A presença de guardinhas pela rua dá uma sensação fake de paz. Eles, com toda sua bravura e destreza motora amealhadas em cursos por correspondência, não são páreos para deter a circulação de malditos mendigos, punguistas, meliantes e chinelagem em geral. Porque chinelagem é sempre chinelagem, pouco importando a classificação cretina que os politicamente correctos atribuem a ela.
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E loucos. Esquizofrênicos estão sempre num sofrimento cuiudo nessas cidades grandes. Sei, sei, uma capital, por conta da concentração desordenada de seres humanos, é lugar certo para encontrar uma quantidade abastada de pinéis. E na Tristeza não era diferente.
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Aliás, o personagem que apresento, Carlinhos, era diferente. Era bem arrumado, com camisa polo azul, razoavelmente limpo (quem seria 'totalmente' limpo nessa vida?) e falava com calma. Tinha até umas ideias obtusas sobre como limpar os arroios de Porto, para que seu querido Guaíba se tornasse o outrora estuário espelhado que já banhou as plagas gaudérias do leste.
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Conheci o figura por conta de uma abordagem dele, enquanto eu tirava fotos da prainha no fim da Padre Reus, a respeito de uma camisa verde da Marka Diabo que uso. Ele apontou pro desenho e me perguntou se era a prefeitura de Parobé na estampa (era viajado, o cidadão). Respondi que não, era apenas o edifício da Capitol, em Los Angeles:
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- ... os Beach Boys gravaram lá, saca?
- Ah, é? E o que esse Pit Bóis toca?
- Olha...
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Falei que eram músicas de amor. Menti, mas preferi não estender muito o assunto. Carlinhos me tirou pra confidente. Eis o carma de quem é simpático com a sociedade. Tivesse eu saído correndo, gritando feito um porco fugindo do abate, teria reescrito um trecho de minha história.
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- Ô, cabeludo, porra... cara, eu fui tri apaixonado por uma mina que morava no Nonoai, tchê! Sabe o que é ser apaixonado?
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Não, não sabia. Mas já que o psicólogo era eu mesmo, ouvi a história.
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- ... e um dia ela foi embora pra Guaíba. Nunca mais tive notícias dela. Gisele era o nome dela. Linda, morena cor de carnaval!
- Tá, e nunca foi atrás da mulher, tchê? Só pegar um busão e se mandar pra Guaíba. A cidade é pequena.
- Tu tá louco? Tá achando que eu sou burro? A ponte móvel tá pra cair, cara! Tem levantamento da prefeitura, do governo federal e dos Estados Unidos... o Saddam fez, sério, tá registrado no cartório do Centro... que a ponte tem problema na estrutura e pode desabar a qualquer momento...
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Teorias conspiratória.
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Enfim... como Gisele e ele eram muito ligados espiritualmente, era lógico imaginar onde ela estava em Guaíba:
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- Tá morando na Avenida Alegria, cabeludo! Saca? Eu moro aqui na Tristeza. Ela mora na Alegria. Tá tudo conectado com o espaço, eu li muito isso. O Sistema Solar é pai de todos os corações puros na Terra. Ela me manda mensagem assim. É lógico que ela mora lá. São antônimos, tá ligado? Ela brincava que éramos opostos que se atrairam...
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A Alegria é uma avenida litorânea que, com muuuito custo, dava pra ver de onde estávamos. Cogitei a ideia tola de dizer ao sujeito que havia visto um corpo da cor do pecado se querendo no horizonte, mas seria muita judiação.
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- E o que tu pretende fazer pra reencontrar a mulher? Lançar uma garrafa com um bilhetinho na correnteza, pra chegar lá, hahahah?
- Ôooo... peraí: baita ideia, cara! Porra, meu, tu salvou minha vida!
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Sim, no outro dia lá estava ele no mesmo horário, de camisa do Zequinha e bermuda de 10 pila. A garrafa veio até com o rótulo de Walesa, uma vodka misturada com metanol que vendem para metaleiros pobres. E um bilhetinho dentro, amarrado com fita mimosa verde. Carlinhos veio todo feliz pro meu lado:
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- Taí, cabeludo... a Gisele agora vai saber que eu tô esperando por ela!
- Qual é teu plano com essa parada?
- Vou pegar aquela canoa ali, remar até uns 30m pra dentro do rio e jogar a garrafa. A correnteza que se vire pra levar a garrafa até a mulher, né mesmo?
- Ô, certamente. Tem certeza absoluta que ela tá ligada nessa coisa de Alegria e Tristeza que nem tu?
- Ah, ela é muito inteligente...
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Ela, talvez. Mas meu amigo não. Se errou todo pra remar o barquinho, quase caiu, deu uns berros contra o vazio, jogou a garrafa e imediatamente retornou, sem nem olhar pra onde sua mensagem tinha ido. Eu já não estava mais ali, pois achei que seria prudente tirar meu time de campo, com medo de ser acusado de cúmplice de roubo de caiaque.
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Pelos cálculos de Carlinhos, a garrafa iria naturalmente até a Alegria por contra da correnteza Sul do Guaíba. Ao fim da tarde, voltei à prainha e vi meu brou sentado na beira da areia, em estado catatônico, chorando:
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- Que que deu, bicho?
- Cara... a correnteza é Norte. A garrafa foi pro Norte, cabeludo! Porra...

(crowd goes sad: "Ahhhhh...")
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Que foda, hein?! Segundo suas conjecturas, a droga da garrafa deve ter ido parar na Ilha das Flores e alguma ribeirinha protagonista de documentário cult está se batendo para entender a esculhambação sentimental registrada por ele.
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O certo é que até o fim de minha tour pela Tristeza, semanas depois, podia ver Carlinhos absorto em sua decepção, com a mesma roupa, estourando violentos crivos, sem nem pensar em como consertar seu imaginado erro.
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Imaginado, sim. Ele errou, mas de outra maneira. Havia certamente alguém na Alegria pensando em como encontrar seu rico príncipe nas margens portoalegrenses, após desdobrar o nó da fita mimosa. A correnteza era mesmo para o Sul.
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terça-feira, 5 de outubro de 2010

Só um detalhezinho

Faz a diferença. Experimente tirar uma mangueira de fluido de freio de uma Ferrari e tente parar o carro depois. É... no mundo feminino é assim também.
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Sempre gostei de detalhes no corpo ou na personalidade da mulher. Mas principalmente no corpo, lógico! Eu curto o lance de reparar num cotovelo, por exemplo. Sério! Uma vez eu fui ao Ocidente e tava aproveitando o correrio com a gurizada, tentando, pra variar, ensaiar uns moonwalks tacanhos (tinha morrido com 30 mangos na entrada mesmo), quando avistei uma garivana no mezanino do lugar. Ela estava de vestido, era bonita, mas... seus joelhos! Caralho, mermão, que coisa mais tão doce, bem desenhada, rotunda. Eu fiquei tarado nas drogas dos joelhos daquela loira cretina. E enchi o saco do pessoal na volta, tentando mostrar o quão interessante podia ser aquilo. Ninguém dando a menor pelota. Cegos!
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Desde gurizão, imaginava eu me refestelando em franjas de meninas, peitos sardentos, olhos cor de mel, coxas curtas e grossas, óculos e aparelhos de dentes. Dos fininhos, fique claro. Uma vez eu tava enchendo o rabo de trago com um primo meu e discutindo sobre seios femininos. Minha teoria, comprovada naquela noite, dava conta de que se as tetas da guria fossem pequenas, o que compensava essa sensação era o formato do braço. Se a região do bíceps fosse mais redondinha, feito: pareceria que os seios eram proporcionais e certamente lindos. O primão riu da minha cara.
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Essa porra de detalhe atinge até minha noção de eu mesmo enquanto ser humano. O tamanho de meus olhos, as olheiras cadavéricas, tudo isso me sempre deixava com raiva de meu rosto. Detalhe, né, mas que fazia uma puta diferença entre eu aceitar essa fuça ou não. Arranjei uma namoradinha uns anos atrás que disse que eram a coisa mais lindinha desse mundo. Pronto! Agora olho no espelho do banheiro e vejo a porcaria do Tom Cruise tomando chimarrão nos Pampas.
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Em certa feita coloquei minhas artimanhas para trabalhar (sim, pra alguma coisa tem que servir o lindo diploma que ganhei), em prol de meu saco escrotal. Consegui mostrar, após árdua e dificílima escolha de palavras, para uma determinada moçoila incauta como sou fofo e sensível, apesar de guardar um instinto destruidor de esperanças nesse corpo esquálido. Era uma mulher que há tempos eu mirava com gosto especial, como se fosse almejando um título de Libertadores. Eu estava naquela noite na final, imaginei. Mobilizei o veículo automotor e fui buscar Tati em uma rua erma. Deu certo. Plano infalível. Sorrateiros, frisamos a gadeia do terreno inimigo.
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Não havia até então um detalhe em especial no qual me apegara. Ela toda era interessante. Um corpo bonito, personalidade forte (não era o que chamamos de 'geniosa', que por sua vez é um eufemismo pra xaropona do inferno) e tinha bom hálito e bom beijo. É, experimentei antes. E o que era vontade virou uma pequena obsessão.
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Entramos num local mais privado e logo veio a sensação de que estávamos livres para saborear o corpo um do outro. Bem, acredito que não seja necessário entrar em pormenores de um evento desses, até porque quem lê esse bolicho certamente já passou por momentos semelhantes. Mas algo aconteceu. No meio da luz difusa azul, Tati viu seu sutiã sendo retirado com quatro dedos maratianos (técnica aprendida em algum tutorial por aí) e eis que o 'detalhe', aquele ardilosamente escondido de mim, se revelava. Seios, novamente eles.
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Eis um caso à parte. Seios existem, estão repetidos aos borbotões nesse texto, mas com essa menina, sob a tal luz azul, foi diferente. Um desenho delicadíssimo, cor clara, sem imperfeições de nenhuma ordem, pintadinhos, mamilos róseos, nem olhando para cima nem para baixo. Estavam ali quietinhos, matreiros, convidando esse sujeira aqui para sugá-los miseravelmente. Sou muito obediente.
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Macios, doces (com gosto doce mesmo, tipo açúcar de confeiteiro) e quentes. Como diria um amigo meu: "Cara, tu ia querer morar naquelas tetas!". Eu quis mesmo, por muitos minutos... principalmente quando Tati disse: "Ai, como eu goooosto disso!". Aquilo soou provocante como um general russo ouvindo de seu presidente para apertar o botão da bomba H. Como uma oferta de bananas a um símio. Como balas 7 Belo a pré-adolescentes. Como um técnico mandando um sub-21 enfeitar todas as jogadas em um clássico. Como um trafica balançando buchas na cara de um adicto.
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A judiação da noite, apesar da entrega dos beijos e seios da menina, ficou por conta de que não termos 'completado' as atividades. E isso importa? O que importa são os guizos de Natal em "God only knows", não sua letra. Vale é a cartola de Slash, não seus solos. Vale Paul McCartney sacudindo a cabeça durante algum "uuuhh", não se isso sai afinado. O tri é cheiro a algodão-doce no disco da Kate Perry, não suas músicas. Eu compraria um Aston Martin britânico, caríssimo e perfeitíssimo, só por conta do guarda-chuva inglês que vem junto com a máquina milionária. Quase adquiri uma Ferrari Maranello só pra ficar com a bolsa de golfe, confeccionada em couro de bisão, que dão de presente com o carro. Sério!
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Mas se um dia terminarmos o que paramos tempos atrás, pode ser que eu encontre outro detalhe mais chamativo ainda, como a mancha que carrego no pinto.
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Não... impossível. Acredite.
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A mancha é enorme.

domingo, 18 de julho de 2010

LA TRIP: o trajeto

A viagem foi programada dessa forma, desde o início, para que pudéssemos contemplar o belo de cidades turísticas celestes e hermanas, além de termos a possibilidade de visitar o interior dos países. Por sermos gaúchos, temos nossa cultura, sotaque e costumes intimamente ligados ao modo de vida uruguaio e argentino. Seria lógico testar tudo isso com nossos hermanos.

O passeio será dividido mais ou menos assim:
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20, terça: saída de Taquara rumo à Pelotas, às 13:45. Dormimos lá. É o posto avançado da Trip. De lá partiremos rumo ao Sul de verdade.
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21, quarta: cedinho seguiremos rumo ao Chuí, depois Maldonado (para sacar a praia de Punta del Leste... ou a Punta del Diablo, o que vier primeiro). O objetivo é, na real, Montevidéu, onde dormiremos.
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22, quinta: La Ciudad Vieja, parte histórica de Montevidéu. Estádios, bares, lojas e gente. Dormiremos de novo.
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23, sexta: Saída de manhã da capital celeste. Rumo a Colônia de Sacramento, de onde chegaremos de balsa a Buenos Aires. Dormiremos na capital porteña.
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24, sábado: Buenos Aires e tudo que a cidade oferece: bares, estádios, lojas, lugares históricos e essas coisas lado B que a turma sempre acha no meio do caminho. Dormimos na cidade.
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25, domingo: E dá pra conhecer BA em apenas um dia? Não... definitivamente, não. Dormiremos depois por lá.
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26, segunda: Saída de manhã rumo à Rosario. Chegada à tarde. Dá tempo de curtir umas coisas por lá. Dormiremos.
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27, terça: .Dia inteiro para aproveitar a cidade de Maradona e Che Guevara. Última noite no lugar.
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28, quarta: Saída de manhã cedo rumo à Córdoba. Chegada à tarde. Tempinho para conhecer a parte universitária do lugar. Dormiremos por lá mesmo.
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29, quinta: Conhecer a cidade universitária. Dormiremos por lá.
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30, sexta: Saída cedo rumo a Santa Fe. É o segundo trecho mais longo da viagem. Dormiremos na capital da província.
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31, sábado:.Cedinho, rumo a Rivera para as compras do dia seguinte. Caminho comprido até a fronteira do Uruguai com o RS. Dormiremos em Rivera ou Santana do Livramento.
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01, domingo: compras pela manhã se os Free Shops estiverem abertos. Volta à Taquara, certamente sãos e salvos e tapados de histórias pra contar.




Dados técnicos:

- Integrantes de La Trip: Carlos "Kako" Brack (dentista), Vágner "Marat" Zíngano (professor e músico), Rômulo "Dóc" Carniel (dentista e músico) e André "Paleta" Amaral (jornalista e músico).
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- Veículo: Fiat Palio Fire Economy 2010, com 6.700 km rodados.
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- Música de bordo: Rock e algumas poucas variantes.
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- Material de registro: câmera fotográfica e de vídeo digitais. Canais de Twitter, Orkut, Facebook e Youtube (depois da viagem).
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- Patrocinadores: Marka Diabo camisetas, Mundo Imaginário comunicação visual e Downhill roupas e acessórios.

sábado, 17 de julho de 2010

LA TRIP: 2ª parte

Então, depois de testarmos a Kombi do Marat de todas as maneiras possíveis na praia de Garopaba esse ano, demos como certa a viagem nas férias de julho. A van correspondeu bem, andou rápido e aguentou várias vezes estradinhas esburacadas com lama e 8 pessoas dentro, sem negar fogo.
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Mas chega, então o fim de maio de 2010 e começamos a perceber que o integrantes do Bloco Também Tô na Pedra já tinham programado outras coisas para o meio do ano. De 7 ou 8 pessoas, vimos nosso plantel diminuir para quatro mancebos: eu, Kako, Dóc e Paleta. Viajar assim, numa Kombi, seria pedir para torrar dinheiro. É um veículo confiável, mas faz só 10km/l na estrada.
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O Palio do Kako! Eis aí a solução. A partir disso, começamos a arregimentar as coisas todas: carta-verde (um seguro internacional), revisão de quilometragem (o Palio tá atualmente com 6.700 km rodados), hospedagem (processo ainda não totalmente concluído) e lugares para visitar. Verificamos documentos pessoais e acumulamos dinheiro. Avisamos Deus e o mundo.
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E fui atrás dos patrocinadores. Na real, corri pouco em função disso. Tava cheio de coisas pra fazer, enfim... mas contei com a parceria do Murilo, do Felipe e do Nino Lee, que colocaram suas marcas (respectivamente: MUNDO IMAGINÁRIO comunicação visual, DOWNHILL bike and street roupas e acessórios e MARKA DIABO camisetas) no carro, garantindo, assim, uns bons pedágios custeados ao longo do percurso.
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O percurso: no próximo texto.

sábado, 10 de julho de 2010

LA TRIP: um pequeno apanhado de ideias

Eis que a turma toda vai finalmente encarar as estradas hermanas. LA TRIP é uma viagem de 10 dias por Uruguai e Argentina em busca das raízes castelhanas que os integrantes do passeio acham que têm.
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A ideia de uma tour pela América do Sul nasceu nos idos 2007, na saída de uma noitada alcoólica do Tio Remi, em Igrejinha. Eu, Paleta (o Costela de minhas crônicas) e Rômulo começamos a conjecturar sobre como faríamos para juntar grana e encarar as estradas do paralelo 30. Usamos como exemplo uma trip de amigos do Rômulo, para o Peru, e o pouco gasto que tiveram com gasolina e estadia. A ideia começou a fermentar violentamente na cabeça quase balzaquiana do pessoal. E seria, assim, o rito de passagem necessário, embora tardio, para a 3ª década de vida. Algo parecido com o que Che Guevara e seu amigo fizeram pela América Latina (sempre ela...) de moto, mas com o mesmo mote.
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O verão de 2009, na Praia da Pinheira-SC, serviu para fomentar nosso grupo. Batizada inicialmente de Bloco Também Tô na Pedra (ironia com grupos carnavalescos e com a droga estúpida da moda, o crack), a turma lamentou em primeira instância a falta de um carro como uma Kombi para arrastar as gentes pela praia e, futuramente, pelas calles porteñas. Dei início, então, à primeira fase da coisa: comprei uma Kombi.
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Chegando ao meio do ano, tínhamos em mente que as férias de inverno serviriam de motivo pleno para que deixássemos alguns dias de emprego, ou todo ele, para trás e montássemos o cronograma exigido para esse tipo de deslocamento. Logo pensei em captar patrocínios para ajudar nos pedágios e gasolina, coisa que nos aliviaria a conta final. "O Mará tem uma puta alma gincaneira", dizia Paleta.
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Só que a Kombi carecia de uma série de ajustes mecânicos e de uma lanternagem convincente. Até daria para fazer, caso eu tivesse tempo de sobra. Não tive: estava no início de um trabalho de conclusão que consumiu, junto com um estágio, meus neurônios para sempre. Mesmo assim, os membros do Bloco, eu, Paleta, Rômulo, Kako, Tomaz, Robson e Fabinho seguíamos em busca de informações sobre câmbio, estadia, lugares para visitar, etc.
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Saí com uma proposta de patrocínio debaixo do braço e tentei dois lugares, sem ter encontrado os responsáveis. Voltei para casa, sentei a bunda no sofá, liguei a TV e o Globo Notícias me avisa que a gripe do porco estava instaurada na Argentina, alastrando pro Uruguai e em breve tava todo mundo morto! Cem mil casos na terra do Gardel! Pensei logo: "Ninguém vai patrocinar um lance para levar 7 bagaceiros para um lugar infestado de gripe e trazer essa merda para cá!".
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Viagem cancelada. Fui xingado, ameaçado de excomungo até. Mas pude terminar (não muito) a chapeação da Kombi e o trabalho.
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Sabíamos que no verão ficaria complicado para nós, devido a Paleta estar conseguindo emprego, Kako também, Robson ter casado, Tomaz viajado... essas coisas. Fomos, então, testar a Kombi em nova viagem para Santa Catarina.
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(continua no próximo texto)

domingo, 27 de junho de 2010

Butiás de bolso

- Oi, Marat, que bom que tu veio mesmo!
- Claro, Marília! Eu combinei contigo... isso para mim é uma convocação!
- Hahaha, bobo... tudo bem?
- Tudo! Cê tá linda, hein?
- Que isso... tu que é um fofo. Tu é bem diferente dos outros caras que me convidam pra sair.
- Ah, obrigado... assim eu vou ficar me achando mais do que já me acho.
- Sério... tu me trata que nem gente. Tipo, eu não sou essas patricinhas, tu viu onde eu moro...
- Olha, Mari, as patricinhas levam vantagem, geralmente, por 'n' fatores. E a questão é, sim, o fator dinheiro e status. Por isso que as meninas mais pobres começam a vida madura mais cedo...
- Como?
- Explico: se um cara chegar em ti, tu sendo de menos posses, e tu cortar o cidadão, ele poderá te chinelear às ganhas, lembrando indelicadamente onde tu mora e coisas assim. E vai te mandar à merda, deixando caminho livre pra outro. O processo vai continuar até tu começar a se sentir definitivamente queimada no meio masculino. Por isso, gurias como tu sacam que devem se entregar mais facilmente aos caras, justamente para manter a tranquilidade e não ser achincalhada de graça.
- É, é bem assim!
- Já as patriçoilas têm crédito. Um cara chega numa delas e certamente vai ouvir aqueles esparros típicos de gurias mimadas. Mas como ela tem grana e status, o cara vai insistir. Assim, a guria vai poder enrolar o máximo, sem que ela ouça barbaridades. Afinal, quem ousaria xingar uma menina que todos querem? Nisso, elas acabam descobrindo seu corpo muito mais tarde.
- Hahah... pior: esses guris são muito trouxas. Ficam se atirando em cima dessas gurias cheias de frescuras, hahaha...
- É, eu sei como é. Bem, mocinha, e para essa noite? Sugiro uns lugares legais, como o Divina Comédia, em Porto: lá tem umas bandas e tal e um som agradavelmente pop, mas com informação. Ambiente todo anos 40 e tal...
- Hummm...
- Tem aqui pela região o Pop Cult, em Noia, onde rola só bandas com som próprio e o lugar é mais lado B e tal. Tem o velho Tio Remi, em Igrejinha, onde eu já toquei umas 200 vezes e é sempre uma opção afudê e com bandas de Rock muito interessantes.
- Ai, tá... mas por que a gente não vai lá no Star? Dizem que hoje vai tá muito fera!
- Star? Aquele onde rola só bailão?
- Ééé! Vamos! Vai ser tri...
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Depois dessa, até achei que 3 pila pro táxi de volta saiu caro demais.

sexta-feira, 18 de junho de 2010

A televisão me deixou burro

- Mil quatrocentos e quanto???

Nem terminei de ouvir a proposta indecente do vendedor. Ora... precinho salgado para ver essa Copa de caneladas mil numa TV nova, hein?!

Tentei comprar uma mais na onda de ter algo moderno em casa, mesmo não sendo lá meu feitio. Meu televisor atual emite seguidamente uma onda sonora incrivelmente irritante e aguda, próxima ao ultrassom. Incomoda pra caralho, o gato de casa fica louco e a família briga. Tivesse eu perto do botão-da-bomba, tratava de mandar um continente pelos ares! Então, lá fui eu para adquirir a tão sonhada telinha de LCD ou plasma, tanto fazia. Falo dessas maravilhas planas, pretas e com a base pesada, que decoram desde salas da burguesia a casas de emergentes. Em qualquer um dos casos, creio que nunca seriam ligadas mesmo.

Mas a real é que foi sorte estar tão cara. Pensando friamente, não há vantagem alguma até agora em você pegar seu rico dinheirinho e torrar num aparelho desses. Sim, eu também já vi as propagandas dizendo sobre a bestial vantagem do mundo digital, como o sinal que vem sem chuviscos e fantasmas, enaltecendo a riqueza de detalhes das imagens. Só que eu devo estar de muita má vontade com o modus vivendi atual mesmo.


Já passei pelas lojas que vendem essas coisas e vi os vídeos que os malandros botam a rodar para convencer o cliente. É só filmagem de paisagens vastas, detalhes em close de plantas supercoloridas, água corrente e movimentos de águias americanóides em câmera lenta. Lindo, não? Não. É só grudar o olho na tela e ver a intensa pixelização, o contraste ligado às ganhas e a imagem alargada, fazendo a Xuxa engordar não os outrora 5, mas 10kg. Nem experimente ver a programação da TV aberta num objeto desses: os chuviscos, que foram tecnicamente banidos, aparecem como que por mágica.

Talvez seja um processo inevitável, esse, de jogar fora sua velha TV de tubo de raios catódicos (nome bem mais afudê que "tevê de plasma"). As imagens que chegam da Copa da África já descem previamente esmagadas para quem assiste pelo tubo. Logicamente, ficariam normais numa tela mais larga; por isso é de propósito os malditos tira-teimas com marcações fora dos limites laterais de sua velha Philco-Hitachi.

Em breve aparecerá um grupo saudosista zelando pela eternização da TV de raios. E estarei com eles, baseado nos mesmos princípios que prendem milhares de músicos aos ainda perfeitos amplificadores à válvula. E ao fato de poder assistir a velha tela de lado, e não só em linha reta.

Insistência

- Mulheres são perigosas, Costela...
- Total... mas qualé? Vai querer jogar pelo outro time agora, seu merda?
- Não, cara... só falei que são perigosas!
- E?
- Gosto do perigo, meu. Isso é que é foda... hora dessas ainda tomo no zóio.

sexta-feira, 11 de junho de 2010

O menestrel dos dissabores urbanos

- Tá, mas vamo comer pela rua mesmo, né? Eu vou no pescoço daquele cachorro-quente da República e já eras!

- Eeeei, ô, meu! Tu come esses troço na rua e depois morre, hahahah!

- Sugere o quê?

- Vamo comê no (nome censurado)... bem melhor.

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Voto vencido que geralmente sou, acompanhei meus amigos cretinos até o lugar citado, disposto a doar meu ordenado ao capitalismo selvagem da capital de todos os gaúchos. Pedi um infalível xis-frango (desses que, volta e meia, me presenteiam com um ossinho perdido no meio das carnes) e cuidei o atendimento. Foi ruim. Sinal de comida boa.

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Mas como toda regra tem lá sua maldita e deslocada exceção, veio uma droga de um xis-prato, tipo de restaurante, a coisa mais sem graça, boçal, bundona e insípida que há. Saca que eu prefiro xis de pegar com as mãos? Prefiro ter aquele domínio da presa, como quem gruda os dedos no braço da primeira china que aparece se arreganhando pro vivente. É uma espécie de nível de dificuldade que dá charme ao processo como um todo. Tem xis na Cidade Baixa pré-programado para deixar impossível o cara comer a merda do alimento rapidamente. Só que o negócio esfria uma hora; não é como os cachorros-quentes famosos de Porto, que, quentes ou frios, continuarão a ter formato de barca cheia navegando pelo Létis.

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Essa parada de nível de dificuldade, outrora retratado com autoridade incomum por mim mesmo, aqui no RWOL, tem lá todo um cuidado para que não extrapolemos os limites do minimamente aceitável. Tipo, tá, o malandro vai numa churrascaria pra matar a fome e sentir o gostinho defumado de carne de boi e tudo o mais... mas não é um churrasco! O tri mesmo é juntar a bagaceirada, tomar ceva ou capirinha (Fúlvio faz umas de derrubar a galera), espetar os cortes bovinos, salgar, fazer fogo, abanar a porra dos carvões, meter a droga toda pra assar e cortar, enfim... tem ritual. Quem prefere um CD do The Who se o Nino Lee tem um triplo dos caras, um branco, outro azul, outro vermelho, justamente para gastarmos minutos olhando pros discos e mirando a agulha nos sulcos? Quem compraria chimarrão em caixinha, se a graça é justamente montar a cuia, a erva... falando em erva, quem compraria maconha pronta? Bom, não é o caso agora.

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Todos numa faceirice cuiuda e eu já de beiço. Frescura minha, eu sei, afinal o que não mata, engorda... e certamente isso valia para uma alfacezinha minúscula que se mexia pelo prato do Mará. Espantado, conferi de perto e vi que era uma larvinha verde, simpática e fofa, que fugia do meio das verduras de meu xis-prato. Tadinha: se viu perdida e zelou por sua vida.

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Como eu, em princípio, zelava pela minha também, tratei de sentir nojo. E ri. Os camaradinhas já ficaram receosos para com seus xises. Provavelmente alguma amiga de Pituxa, a larva quente, deveria a essas alturas estar sofrendo com meu tubo digestório. Chamei o garção:

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- Ô, meu guerreiro, seguinte: bah, tem uma alface ambulante no prato do beleza aqui.

- Opa... quer que façamos outro xis?

- Nanana, já eras... vou meter esse mesmo. Foda-se!

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Tem coisas famosas que realmente te levam a ser convencido de que tais coisas são boas. Fui a um show do Rappa num evento de uma rádio local, aaaaanos atrás. Na real, fui ver Capital Inicial. A banda de Falcão veio antes. Pensei: "Porra, esses caras são tri falados, ganham prêmios cretinos e o escambau, e só conheço 'Vapor barato', 'É dia de feira' e 'Pescador de ilusões'...". Fui para ficar chapado com o som deles. Queria que me mostrassem o porquê do auê todo.

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Lógico que tomei no cu tranquilo. Era para ser um show de Rock, mas vi um de rap, pois Falcão não canta ao vivo; ele fala as músicas. Ouvia o baixo alto (!) e embolado, sem ser culpa da banda. Sentei nas britas, cultivei uma bermuda suja de mijo, cerveja e poeira. E achei tudo uma merda.

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Fim da comelança. Fomos pagar. Galerinha desembolsando tartarugas-marinhas e eu na espreita.

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- Ô, rapaziada, quem é o cara do xis que deu problema?

- Opa, sou eu, campeão!

- Tá, seguinte: não precisa pagar. Fica por conta da casa.

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Nessas horas é que penso que os bichinhos de Deus, que tanto afofam o húmus necessário para as arfácia crescerem, são bem-vindos em nossa alimentação e ajudam no capitalismo selvagem. Com o dinheiro poupado, comprei uma jaqueta jeans suburbanolondrina num brechó monmartriano da Lima e Silva.

quarta-feira, 9 de junho de 2010

Desistir? Nunca!

O papo ia bem. Regado a bom vinho, em um dos bares da República, rua razoavelmente metida a boêmia na capital.

— Sim, eu já vi essas trilogias! Achei legal demais. Mas adorei também “O fabuloso destino...

— ... de Amélie Poulain”, sei qual é. Hehehe... vi com uma ex-namorada minha. Ela pirou que queria ser a Amélie e andar de lambreta por aí. Mas eu tenho uma moto sem freios e ia ficar deprimente.

— Ai, que viagem, hahah! E música? Gosta de Teatro Mágico?

— Mmmm... tu gosta de Legião Urbana? Smiths?

— Sim, sim, mas e de coisas novas?

— Sei lá, sabe? Sou meio resistente por natureza, mas bandas como Valentinos, Pública, Fuzzcas... acho que eu posso citar essas. Uma hora vamos num show deles por aqui.

— Eu pago o vinho!

— Eu pago o estacionamento...

— Nem parece que a gente já tá conversando há horas, né?

— É, é... mmm, hmmhmhmh...

— Marat... que que tu tá fazendo?

— Hã? Olha... na minha terra, a gente chamava isso de “estou tentando te beijar”.

— Ai, na boa?! Não parece meio cedo? Sério, Marat... não me sinto bem ficando com um amigo meu.

— Tu não fica de jeito nenhum com amigo teu, é?

— Não fica brabo. Eu sou assim.

— Então tu pega a droga do Teatro Mágico e enfia no teu cu, xaropona do caralho! Sua bundona de merda! Vai cagar no mato com Amélie Poulain e sei lá mais quem, porque essa porra é chata pra caralho! Tua vida deve ser uma merda de um simulacro da realidade, no qual tu deve se achar a enviada da porra da sabedoria e castidade, mas não suporta um fim-de-semana sem dar pro primeiro sujeira que aparecer na frente!!!

— Credo, guri idiota! Tu tá louco? Que que eu te fiz, meu Deus? Olha que ridículo! E eu pensando que tu era meu amigo, hein? Nossa...

— Bem, agora que não sou mais seu amigo, vamos continuar a partir da cena do beijo?

— Credo! Nojo!

Ainda entre o riso e a sensação de ser um eterno loser, ajeitei as cadeiras, paguei o vinho, o estacionamento, o pato e mico.

terça-feira, 8 de junho de 2010

Confissões de meia-idade adulta

Jr. diz:
... e tô ouvindo uns lances mais da antiga e tal...

Dóc diz:
Pode crer... mas tipo o quê? Tropicália?

Jr. diz:
É, isso aí! Uns negócios assim...

Marat diz:
Bah, pra ti que curte percussão, deve ser massa pra caralho!

Jr. diz:
É... tem umas coisas bem foda ali...

Costela diz:
(pita um crivo...)

Dóc diz:
Deve ter uns lances massa nesse pessoal dessa época, tipo Novos Baianos, Mutantes, Tom Zé...

Marat diz:
Cara... tenho que falar uma coisa: não gosto de Tom Zé.

(momento de incredulidade automática)

Marat diz:
Sério, gurizada... bah, não tenho saco. Aliás, acho que, com 29 na cara, depois de ter conhecido o mundo que conheci e conversado com todo mundo que conversei, já posso dizer com autoridade: não acho a mais vaga graça em Tom Zé... nada contra, mas... porra!


Dóc diz:
Eu tenho umas coisas do Tom Zé em casa, mas não ouvi muito... mas tem uns troços tri.

Jr. diz:
Ah, cara, eu curto Tom Zé...

Marat diz:
É? Mas tu ouve em casa isso? Ou só curte por ter informação musical?

Jr. diz:
... meu...

Costela diz:
Ô, Jr., diz DUAS músicas do Tom Zé.

Marat diz:
... e não pode ser "Batemacumba" e "Namorinho de portão"!

Jr. diz:
É... tem umas ali...

Saimos, por via das dúvidas, de fininho daquele churrasco. Não seria nada bom para nossos ouvidos ou reputação que as pessoas soubessem que havia roqueiros que não ouviam Tom Zé por perto.

Jr. diz:
Tá, mas e Secos & Molhados, Mutantes, Novos Baianos...?

Marat diz:
Do caralho! E Gal Costa também.


Jr. diz:
Legal, legal...

Marat diz:
Não dá bola pra mim, cara: eu sou do tipo de gente que gosta do 1º disco do Los Hermanos todo...

sexta-feira, 28 de maio de 2010

O negócio é não ser um bundão cult

Fomos direto pra casa do Costela com as gurias, sem elas saberem que não haveria a tal pizza que combinamos. Azar delas: dava pra ver na nossa cara que havia alguma coisa de errado com a possível imagem de cordeiros que devem ter feito de nós.

Se bem lembro, eram 6 caras e 4 meninas. Costela já estava com sua meio-namorada; essa não contava. Sobraram 3 moças e 5 cidadãos famintos. Quando as luzes da sala se apagaram, após um verdade-ou-consequência do inferno, uma delas, gêmea gata de outra, já tinha caído nas ricas graças do mais chatito do grupo, o cão matreiro Técnico. Logo, a outra se bandeou com Rodrigo para o andar de baixo da casa.

Ficaram eu, Fúlvio, o dono do Fusca que nos carreteou até a casa e uma menina um tanto quanto lado B, a Bebel. Na cabeça e no físico.

- Tá, Marat, vai pegar ali ou não, porra?
- Sossega... tá na mão pra mim.
- Então vai logo, que senão eu vou!


Fúlvio não era de perder tempo. As luzes apagadas, os guris zanzando nervosos em volta como moscas na merda e eu sentado no braço do sofá, como um palerma esperando a droga da timidez me deixar fazer em paz as coisas que eu curto nessa porra de vida. E Bebel ali, paradita, pensando decerto "caceta, mas só tem cria nessa casa...".

Eu havia conversado com ela uns dias antes num posto de gasolina. Enquanto as gêmeas faziam o escarcéu clássico de meninas com hormônios em polvorosa, Bebel era mais comedida e engatou uma "troca de ideia" de quem, de fato, quer conhecer o oponente.

É nessas conversas em que acabamos sempre caindo no gosto musical da pessoa. E para mim isso é quesito eliminatório. Mas eu tenho a sorte grande desse mundo e sempre papeio com mulheres oriundas de ambientes esnobes. Arrota-se fino caviar quando come-se melequentas sementes de mamão.O legal não é dizer que gostam de Beach Boys... não, eles são muito bregas! O tri mesmo é catar lá do universo paralelo alguma banda desconhecida e adorá-la justamente por ser desconhecida, pouco importando se é boa ou não. Tem é que ser diferente.

Muito chato isso. Numa conversa, sempre estaremos com a impressão de estar aprendendo (o que é bom) com a pessoa errada e mais chata do pedaço (o que é enfadonho). Sim, acontece com meninas isso, principalmente em se tratando de fêmeas da capital.

- Eu curto muito Suburban Kids With Biblical Names... nossa, muito massa! E tu, Marat?
- Olha, tchê... tô ouvindo ultimamente Eric Carmen...
- Ui, credo!


Creio piamente na teoria que um ser humano chega a um nível tal de cultismo que ignora as coisas mais farofas que há no mercado fonográfico mundial. Ou arranjam alguém que sempre foi um bosta e resolvem erguê-lo à condição de mestre ou poeta mal compreendido. Bundões! É gente que não tempera a porcaria da massa Miojo com o tempero artificial clássico, por achar esse negócio padrão demais.

No caso específico de Bebel foi até tranquilo. Batemos os gostos de cara e ela estava "pré-trovada" para a noite da casa do Costela. Baseado nesse preceito besta, lá fui eu testar minha terrível timidez, já citada. Os guris pressionando, eu querendo a Bebel e ela me querendo. A silhueta de seu crânio de cabelos desarrumados, mas presos, estava sob efeito da luz da rua, num efeito cafona e convidativo. Eis que o brilhante poeta aqui teve a louvável ideia de se expor da maneira mais estudada, arrebatadora e que provava todo um estudo até então. Dei no meio mesmo:

- E aí... Bel... que tal a gente ir prum cantinho?
- É, legal... onde?
- Ali, naquele sofá!

Gênio.

Funcionou, óbvio. Ficamos nos enrolando durante HORAS e foi tudo bem...

... ou não. Saldo da noite: Rodrigo viu sua gêmea mijando no pátio da casa, Técnico disse que comeu umas 3 vezes a outra (eu não vi, deixo bem claro), Costela farunfou sua menina e eu sai com os dedos com o cheiro agridoce da intimidade de Bebel. Tomamos um café na casa do beleza e aí que eu me liguei o odor de minhas mãos parecia... látex. Porra (literalmente, talvez)!

Oh, sim, ia esquecendo: as gêmeas levaram uns discos do Costela emprestados para sempre e achei Bebel, anos depois, vestida de tal maneira masculina que fiquei preocupado com minha reputação ao titubear entre um beijo na bochecha ou um aperto de mãos.
A banda que nos uniu? Hoje, até acho ela meio bundona, mas gosto dessa merda.

sábado, 22 de maio de 2010

Bebeco Garcia não morreu. É sério!

O facto é que um maldito tumor encerrou a vida de Bebeco Garcia, amigo nosso. Bem eu o disse: a vida. A obra estará viva, graças à tecnologia, com vídeos, discos e imagens diversas. E estará dando a cor vinho de seu paletó aos violões chorosos que, alegre e paradoxalmente, soarem pelas ruas das cidades.

Claro que é pieguice absoluta falar de alguém já morto e enaltecer sua vida. Então, como achar detalhes da vida do homem é barbada, bastando procurar no Google, digo que quase chorei ao ouvir "Tô de saco cheio". Não, talvez não tenha sido por isso.

Talvez seja porque eu, na segunda música do show que fizemos juntos, Desvio Padrão e Bebeco, eu tenha olhado para o lado e pensado: "Puta merda, esse véio fez as músicas que eu tocava no violão até poucos 10 anos atrás...".

Morre um ídolo, talvez não tão importante pra mim quanto Cazuza, Renato Russo, McCartney ou Brian Wilson. E nem conheci Chaminé, nem conheço o Fughetti Luz... mas fiquei triste.

Será que, de verdade, as cordas da Flying V de Bebeco pararam de tocar?

Marat diz:
Cara, eu tava pensando nesse negócio do bebeco
meu, te pergunto:
eu quase chorei agora há pouco, ouvindo TÔ DE SACO CHEIO.
É normal isso?

Fábio Fischer diz:
cara, quando eu fiquei sabendo foi tipo "ah, tranquilo", saca?
a daiane morais me contou por msn logo que eu acordei
na hora tranquilo
mas, de noite depois quando eu tava voltando da aula e tal me deu um aperto cara
daí cheguei em casa e ouvi ipanema e tava rodando um som dele atrás do outro
daí eu senti uma dorzinha.
ídolo do cara, e nós tivemos a chance de tocar com o loco duas vezes...
uma lembrança massa que eu tenho dele foi da passagem de som no centro de cultura
os caras mandando baixar o volume e ele puto da cara: "rock tem que tem pressão, tem que ter pressão" ahahah

quarta-feira, 5 de maio de 2010

Provas de amor

- Sabe o que é, Marat... eu queria que ele olhasse mais para mim...
- Bah, mas logo ELE? Sério, o Tiago é um bundão profissional! É o tipo de jumento que se tu mostrar uma porcaria de uma garrafa térmica e disser "bem, Tiago, essa droga é uma térmica... o que é isso, Tiago?", é capaz de pensar duas vezes antes de responder...
- Ai...
- E ia errar, ainda!
- Ai, Marat... ele é legal...
- Bã... super!
- Ele é bonito, simpático e me diz umas coisas...
- Ele é meio metido é plêiba, né? Já vi esse malandro desfilando com um Golf-de-som, com música eletrônica nas alturas... chato pra caralho! É um cretino de mau gosto que logo, logo vai aparecer com um adesivo escrito Tiago & Fulaninha no vidro traseiro. Depois, toma chifre e não sabe o porquê: até o nome da namoradinha tá escancarado ali, pra facilitar o ataque dos lobos...
- Ai, gosto não se discute...

(momento de tensão. Gosto não se discute? Como assim?)

- O fato, Kelly, é que atrair a atenção desse tipo de animal é meio perda de tempo. Tipo, é um cara que, de tão inútil, ia precisar de alguém muito inteligente ao lado.
- Tu tá dizendo que eu sou burra?
- Não exatamente. Mas tu daria o que em troca pra ele?
- Ai, né... coisas de mulher.
- Eu sei. E no teu caso deve ser uma delícia, com todo respeito.
- Brigada... mas ó: ah, eu daria carinho, mas quero um homem legal, bonito, que saiba conversar, seja trabalhador...

- Basicamente, tudo o que o Tiago não é. Mas vou defendê-lo. Kelly, o homem quer mais que um corpo bonito, mesmo que isso tu tenha de sobra. E dizendo que daria carinho pra ele fica parecendo um jornal desses novos, em que tudo é no futuro do pretérito...
- Quê?
- Esquece. Um cara quer uma mulher inteligente e simpática, pois mulher para transar tem por tudo aí.
- É?
- É. E quer uma mulher que não o faça esperar para ficar arrumada. É o tipo de coisa que dá no saco e torra a mísera paciência que o machaiêdo tem. E que não peça as malditas provas de amor! Tu pede essas porras?
- Claro, né?! Tem que mostrar que me ama.
- Pois é. Tá errado isso. Mulher é craque em descobrir direitinho a atividade ou gosto que mais agrada ao cara. E dá um jeito de foder com isso. Às vezes, as provas de amor, do tipo "ah, tu me ama? Então, prova!", são só um posicionamento nojento que faz uma pessoa se obliterar ou anular em prol do maldito ego de outra.
- É, acho que tu tem razão...
- Tenho, sim, Kelly. Se tu for esperta, até vai sair com o Tiago, embora eu não recomende. Mas faça com que ele se sinta livre para poder curtir ao teu lado. Um cara só quer dividir os momentos bons com as gurias.
- Tu é um amigão, viu? Deixa comigo, que eu vou levar em conta tudo o que tu disse. Entendi tudinho!
- Eu sei... ó, lá vem o dito cujo. E vem numa marra que tá louco...
- Disfarça, disfarça...
- Opaaa! Belezêra, Marat? E aí, Kelly? Firmeza? Seguinte, guria, vâmo dar um rolé com meu Golf? Meti um bicho-papão de 15 polegadas e tá uma sonzêra!
- Ai, claro! Não te importa, né, Marat?
- Mmm? Não, que isso, vai lá...
- Tá, Tiago! Podemos passar lá em casa só para eu tomar um banho e trocar de roupa?
- Olha...
- Se tu quiser sair comigo, vai ter que ser assim!
- Ah, claro, sem galho! Bora lá! Vai ter pagodeira no Centro hoje.
- Tchau, Marat! Vê se me liga, hein? Beijos...
- Beijos...

segunda-feira, 3 de maio de 2010

É, amigo...

Marat chega à casa de Costela para um divertidíssimo "aquéci" antes de a noite de sábado, de fato, começar. Costelinha o recepciona na porta de seu muquifo:

- E aí, porra?! Que que tu trouxe... bah, torpedo de novo, meu?!
- Tomá no teu cu, Costela! Nem pra casar uns R$2,50 tu te presta...
- Tá tri. Mete essa merda na geladeira. Não vamo tomá agora!
- Tem ceva aí?
- Ter, tem, mas é só pra diretoria, hahahah... (abre uma ceva quase na cara do Marat).
- Putz... tu é um merda.
- Fica frio aí, que eu vou... banhar-me.
- Quê, meu?! Tu ainda não tomou banho? Te liguei faz uma hora, porra!
- Shhhhhhh... cale a bôqui! Só não fode com meu Orkut, seu porra!
- HAhahaha... certo que vai rolar um 'bi-curious' no teu perfil e é já!
- Talomierda... (Costela fecha o Orkut e deixa só o Winamp aberto).
- Cara, pelamordideus... corre! O vagabundo sempre se atrasa por tua causa.
- Shhhhhhhh...

(duas horas depois)

- Tá, fica frio que eu vou comer um negócio... comi bosta nenhuma durante o dia todo... ô, Marat, tu tá bebendo cerveja da diretoria???
- Perdeu, preibói!
- Tá tri... vamo bora e vamo secá esse tórps no caminho.
- Já era!
- Tomá no cu...

Marat pensa: "Porra, esse Costela é mesmo um cara bróder. Meu parceiraço!"

Costela pensa: "Tomá no cu..."

sexta-feira, 23 de abril de 2010

Acho que fizeram um gol...

- Acho que fizeram um gol... vem cá ligeiro!

Bela maneira de encerrar uma mijada. Minha mãe chamando para eu ver um gol. Lógico, era do Barcelona! Até que demorou muito para os desgraçados comandados por Ronaldinho encaçaparem uma. Se tomássemos um só seria lucro.

Mas... como assim, mãe, “fizeram”? Será que ela não se tocou, desde o início da transmissão na TV, que o time de branco era o Inter e o grená, o Barcelona? Enquanto eu sacudia o pinto a respingar pelo vaso e arredores, ficava pensando em qual, diabos, dos times tinha balançado a rede. Mamãe bem que podia ser mais restrita e dizer que foi a equipe de branco ou a grená a ter feito o crime. Certo que era a grená. Era a que estava comemorando, não?

- Não sei... ó, vem cá...

Coisa de gente que não tem mais 20 anos. Não soube distinguir quem comemorava; só faltava essa! Mas gentes velhas têm seu valor em minha vida. Juntando a cueca azul-marinho, que tinha dado sorte na Libertadores, saí do banheiro às pressas, pensando em tudo o que eu passei até chegar aquele momento.

Aos 6 anos, eu já era Colorado e tudo o mais. Crianças gremistas e torcedores do Inter se davam bem. Jogavam bola juntos, andavam de bicicleta e, inocentes, cada uma sabia cantar o hino do clube rival. Era engraçado... um dia cheguei em casa, num desses apartamentos de condomínios da Guerino, em Porto Alegre, cantarolando que o Grêmio tinha sido campeão da América. Meu pai usou a psicologia necessária ao momento:

- Olha aqui, piá: se eu te pegar de novo cantando essa merda, te dou uma porrada!

Depois disso, o coração se tingiu em definitivo de vermelho. Foi nessa época em que ouvi meu primeiro jogo do time, via rádio. Estávamos em cima de um caminhão cretino e velho, eu e todos meus amigos, ouvindo um modorrento Inter e Flamengo, joguinho meia-boca da Copa União...

Cheguei à sala. Meu pai e minha mãe olhavam incrédulos para o televisor. Minha gata dormia no sofá, alheia ao mundo cruel que a rodeava. Criei coragem de olhar para a tela.

- ... Adriano é o nome dele!!!

Não... não. O nome estava errado. O narrador estava redondamente enganado. Esse jogador era do Inter. Ouvi direitinho um apito do juiz: na certa, iria dar impedimento. Claro, era isso. Tava impedido. Ninguém faria um gol no Barcelona de 2006. Sabe, era o mesmo time que não fazia poucos dias que tinha enfiado 4 gols no América do México. Jogavam por música. Todos aqueles clichês estapafúrdios e batidos e previsíveis sobre o futebol-arte... tudo ao mesmo tempo num time só. Juntando isso a uma sorte e um marketing danado, tínhamos, então, o Barça do Deco e do Ronaldinho.


Eu ouvi o jogo contra o América na escola onde dou aula. Meus alunos só diziam “gol... é o quarto do Barcelona”. Um sentimento de incredulidade tomou conta da parte vermelha da garotada. Me olhavam como quem procurando um alento, um consolo com o irmão mais velho. Será que dava pra vencer? Sei lá... o Inter já tinha enfrentado o time catalão algumas vezes na história, mas em épocas diferentes e sem essa rivalidade. Nada disso importaria no dia 17 de dezembro. Os registros são resetados nessas horas.

Era gol mesmo do Inter. O narrador queria dar metade da taça pro sujeito que passou uma bola medonha pro tal Adriano. Eu nem lembrava da existência desse Adriano. Depois que saquei que a torcida colorada tinha bronca com um tal de Gabiru. Eu não tinha. Para mim, ele era o cara que entrou no lugar do ídolo Fernandão e era, a partir de então, o melhor jogador do mundo.

Acho que dois dias antes, na mesma escola, rapazes do 3º ano fizeram um bolão. Um pila a aposta. Placares absurdos, como 5x0 para o adversário do Inter, foram comuns. Eu apostei no contrário:

1x0 pro Colorado. Pode anotar!

Risadas. Claro, né? O Inter estava sem seus principais jogadores, vendidos depois da campanha da Libertadores, e ia enfrentar o bicho-papão do futebol europeu.

Depois do gol, depois que a ficha caiu de verdade, saí correndo pela sala de casa, minha gata cruzou na minha frente com o pavor do barulho da mesa de centro (que recebera uma porrada minha, de faceirice), quase piso nela, tum, tum, tum, meus pés fizeram ruído pesado no chão, abri a porta da sacada, me empoleirei na grade e gritei, como se tentasse reativar o espírito de Colorados mortos:

Cadê o Ronaldinho? Cadê o Ronaldinho? HHAhAhaHA...

O resto todo mundo sabe: cobrança de falta dando cagaço na trave do Clemer, golpes de vista para tirar chutes grenás, defesas impossíveis, amarração, marcação, nó na garganta e o inferno. Ganhei R$ 6,75 do bolão, gastei em xis e refri pros meus amigos de aposta e entrei para minha própria história. Tudo teve um desfecho feliz naquela manhã quente de dezembro. Talvez tenha sido tudo por meu avô.

Talvez tenha sido algo premeditado mesmo, como disse Veríssimo. Aquele Inter e Flamengo, que eu escutei na rádio quando criança, tinha terminado num pachorrento 1x1.


publicado originalmente no Beco do Sapulha .

quarta-feira, 21 de abril de 2010

O justiceiro

— É? E que tipo de música tu curte...?
— Ai... eu gosto de tudo. Eu sou bem eclética!


Começamos mal. “Eclética” para mim é a criatura que ouve qualquer bosta que lhe oferecem e acha que está no hype por isso. Não faz o mínimo discernimento entre Rock e sertanejo pelo fato de não ter nem uma rasa cultura para diferenciar néctar de ranho. Denise era assim. Pobre alma.

Mas era gostosa, e isso é muito importante. Era morena jambo, do tipo vileira bonita. A cara entregava a casta, por mais que alisasse o cabelo certamente outrora pixaim. As coxas grossíssimas eram uma atração à parte: de tão fortes, raspavam uma nas outras, deixando o caminhar de Denise particularmente jocoso. Mas, enfim...

Combinei com ela para buscá-la à noite, naquele frio do início de inverno. Liguei meu mini-aquecedor (“tudo na casa desse cara é mini...”, já diria meu amigo Rodrigo) e busquei a Dê. Estava muito bonita, embora a roupa me desse a entender que seria um trabalho medonho para revelar aquele corpão.

Pessoas pixains. Pessoas crespas... deusducéu, como enfrentei isso em minha puta vida. A cada conquista, depois de gastar litros de meu Latim de boteco, eu pensava: “Puta merda, mais um conjunto mortífero de pelos encravados, braços arrepiados e cheiros pesados...”. Depende muito do nível social onde o cidadão ataca. Ou não. Eu já saí com mulheres que dariam orgulho aos nazistas, tal o sangue ariano... e, no fim, crespas. Gente mal cuidada, saca? Tão certo quanto esquadrias de janelas de prédios públicos saírem tortas, certo como bombons envelhecerem rápido, tão certo quanto velas fazerem luz solar em filmes é o fato de que eu pareço um gênio pra essa mulherada, só por organizar minimamente meu palavreado. É cômico.

Pensando melhor, eu mereço, pois já fiquei com meninas insuportáveis que tinham o peito de, deitadas em minha cama, largar bobagens obtusas nos meus ouvidos:

— Sabe, no início eu não gostava de ti, mas agora...
— ... mas agora tu tá aqui pelada na minha frente, né?
— Ai, guri idiota...


Denise era mais na dela. Logo se encantou por um maldito livro que eu estava lendo e que falava sobre Simbolismo. Se encantou comigo, na real, porque pareci um gênio... cê sabe. Disso para rebocá-la pra casa foi um tapa.

O que me irritava de verdade na morena era seu péssimo gosto musical. Prefiro não citar tudo o que eu sabia que ela ouvia. Seria constrangedor. Por mais que fosse um amor de pessoa, simpática, doce e levemente safada, ela tinha que ser punida sumária e exemplarmente. Uma tunda de laço naquela bunda fofa não ia ajudar em nada, mas deveria ser delicioso. Lembrei de quando Joana veio, numa tarde, aos meus braços, fugida novamente de seu marido:

— Ui, que música estranha é essa...?
— Shhhh... é Donovan... fica fria e deita aqui de novo.


Era isso: a punição seria espinafrar boa música na cara da vileira. Imagino ela saindo só com trabalhadores-braçais oblíquos sem um posicionamento filosófico convincente:

— Que música tu quer ouvir, Denise, meu amor?
— Tem pagode?
— Tem, claro...
(entra no som do hino parobeense: “Deixa acontecê na-tu-ral-mente...”).

Falei em posicionamento filosófico? Bem, minha filosofia naquela noite foi anunciar que ela ouviria algo diferente. Fucei nos meus vinis e puxei o assustador “Cabeça dinossauro”, dos Titãs. A capa foi um impacto. Coloquei na vitrola e botei o volume alto o suficiente, direto na música título.

— E aí? Gostou? — perguntei sarcasticamente.
— É... diferente, né?
— Pode crer! Tá, vem logo pra cama...

Eu estava vingado: como uma torta de chantilly à la filme pastelão, joguei música boa nos cornos da mocinha. Vitória, rapaz! Você é mesmo um justiceiro do bom gosto. Hordas de cabeludos cabaços agradecem sua ousadia e entrega ao ideal roqueiro.

Ela se vingou também: sua roupa era realmente difícil de tirar e não saiu de seu corpo a noite toda.